Poucas pessoas conseguiram assistir a um dos documentários mais comentados do Festival do Rio e da Mostra de Cinema de São Paulo do ano passado. Agora, "A ponte" (The bridge") finalmente chega ao circuito. O documentário volta à roda de conversas pelo assunto polêmico e tem gente ainda em dúvida se vale a pena ou não assistir a dramas de pessoas que escolhem a Golden Gate, em São Francisco, para dar fim às suas vidas. Resgatei aqui um textinho que li sobre o filme para o especial do Festival do Rio de 2006. De antemão, aviso: o filme não é para qualquer estômago. Mas vale a pena. Leiam e preparem-se:
Publicado no Globo Online dia 20/09/2006:
As imagens são belas e podem enganar os espectadores desavisados. "A ponte" não é um documentário comum sobre um dos mais famosos pontos turísticos do mundo, a Golden Gate. É um retrato do desespero humano feito por uma equipe comandada pelo cineasta americano Eric Steel. Durante todos os dias de 2004, câmeras em vários ângulos registraram o cotidano das pessoas que passam pelo cartão-postal de São Francisco, Estados Unidos. Algumas delas, especialmente para se jogar de uma altura de 130 metros até o mar.
Steel registrou 24 quedas. Com um rádio na mão, avisava às autoridades o que tinha acabado de acontecer. Algumas vezes, acompanhou a busca do corpo e procurou a família. O filme reúne as chocantes imagens dos últimos minutos de vida dessas pessoas e depoimentos de parentes e amigos. Muitos deles relatam os momentos de depressão e o comportamento diferente dos "padrões da sociedade".
Há cenas impressionantes como a do roqueiro Gene que fica horas andando de um lado para o outro, refletindo, olhando para baixo, mexendo nos longos cabelos até decidir, de uma hora para outra, pular. Também há resgates como a de uma jovem conhecida pela polícia local. Ela já tentou inúmeras vezes cometer o suicídio. Um deles impedido por um turista, que não parou de tirar fotos, inclusive no momento do preparo do salto. Quando se deu conta da tragédia à sua frente, agarrou a garota pelo casaco.
Steel ainda encontrou um jovem morador de São Francisco sobrevivente da queda. Ele relata o que passou na sua cabeça nos minutos finais. "No meio do caminho me arrependi e pensei em uma maneira de sobreviver. Foi aí que inclinei meu corpo para cair com os pés", conta ele. Quem salvou mesmo sua vida foi uma foca que o ajudou a boiar enquanto esperava socorro. Ele quebrou vários ossos da região abdominal e teve hemorragia interna. Hoje, diz ter esquecido a idéia de suicídio. E é quase incontrolável a vontade de rir quando ele fala da abordagem de um turista alemã minutos antes de saltar: "Eu estava aos prantos e ela veio me pedir para tirar uma foto".
Para muitos, o documentário "A ponte" não passa de um trabalho sensacionalista do documentarista, ao estilo reality-show. Para outros, é um serviço público, que deveria levar autoridades locais a procurarem meios de evitar as centenas de suicídios ocorridos todos os anos na Golden Gate. São cerca de dois por mês - o número já chegou a 500 por ano - e muitos deles de não-moradores de São Francisco, que escolhem a ponte como cenário. Até hoje não foi tomada nenhuma providência com colocação de grades ou redes de proteção. E a equipe só pôde filmar com autorização da polícia e Guarda Costeira porque disseram estar documentando a beleza do cartão-postal.
O espectador do festival que escolher "A ponte" (mostra Expectativa) deve estar preparado não só para refletir sobre a polêmica gerada pelo filme mas no desespero do homem moderno. O longa de 93 minutos é um soco no estômago, dá uma chacoalhada na cabeça e faz revirar aquelas dúvidas mais quietinhas da nossa cabeça sobre a miserável condição humana.
As imagens são belas e podem enganar os espectadores desavisados. "A ponte" não é um documentário comum sobre um dos mais famosos pontos turísticos do mundo, a Golden Gate. É um retrato do desespero humano feito por uma equipe comandada pelo cineasta americano Eric Steel. Durante todos os dias de 2004, câmeras em vários ângulos registraram o cotidano das pessoas que passam pelo cartão-postal de São Francisco, Estados Unidos. Algumas delas, especialmente para se jogar de uma altura de 130 metros até o mar.
Steel registrou 24 quedas. Com um rádio na mão, avisava às autoridades o que tinha acabado de acontecer. Algumas vezes, acompanhou a busca do corpo e procurou a família. O filme reúne as chocantes imagens dos últimos minutos de vida dessas pessoas e depoimentos de parentes e amigos. Muitos deles relatam os momentos de depressão e o comportamento diferente dos "padrões da sociedade".
Há cenas impressionantes como a do roqueiro Gene que fica horas andando de um lado para o outro, refletindo, olhando para baixo, mexendo nos longos cabelos até decidir, de uma hora para outra, pular. Também há resgates como a de uma jovem conhecida pela polícia local. Ela já tentou inúmeras vezes cometer o suicídio. Um deles impedido por um turista, que não parou de tirar fotos, inclusive no momento do preparo do salto. Quando se deu conta da tragédia à sua frente, agarrou a garota pelo casaco.
Steel ainda encontrou um jovem morador de São Francisco sobrevivente da queda. Ele relata o que passou na sua cabeça nos minutos finais. "No meio do caminho me arrependi e pensei em uma maneira de sobreviver. Foi aí que inclinei meu corpo para cair com os pés", conta ele. Quem salvou mesmo sua vida foi uma foca que o ajudou a boiar enquanto esperava socorro. Ele quebrou vários ossos da região abdominal e teve hemorragia interna. Hoje, diz ter esquecido a idéia de suicídio. E é quase incontrolável a vontade de rir quando ele fala da abordagem de um turista alemã minutos antes de saltar: "Eu estava aos prantos e ela veio me pedir para tirar uma foto".
Para muitos, o documentário "A ponte" não passa de um trabalho sensacionalista do documentarista, ao estilo reality-show. Para outros, é um serviço público, que deveria levar autoridades locais a procurarem meios de evitar as centenas de suicídios ocorridos todos os anos na Golden Gate. São cerca de dois por mês - o número já chegou a 500 por ano - e muitos deles de não-moradores de São Francisco, que escolhem a ponte como cenário. Até hoje não foi tomada nenhuma providência com colocação de grades ou redes de proteção. E a equipe só pôde filmar com autorização da polícia e Guarda Costeira porque disseram estar documentando a beleza do cartão-postal.
O espectador do festival que escolher "A ponte" (mostra Expectativa) deve estar preparado não só para refletir sobre a polêmica gerada pelo filme mas no desespero do homem moderno. O longa de 93 minutos é um soco no estômago, dá uma chacoalhada na cabeça e faz revirar aquelas dúvidas mais quietinhas da nossa cabeça sobre a miserável condição humana.
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