segunda-feira, 27 de agosto de 2007

Jazz

























Ele pensou em ligar pra ela novamente, dizer que não era bem assim, que a amava, que precisava dela... mas foi um pensamento breve, passou e ele desistiu, mesmo porque ela já sabia de tudo o que ele tinha a dizer. Sabia e não dava a mínima. Sabia e o tinha mandado à merda. Desligou o telefone, desligou-se dele. Ele que fosse pro inferno, foi o que ela disse.

Ficou ali com os pés sobre a mesa olhando profusamente para o aparelho telefônico imaginando se houvera mesmo a conversa de há pouco. Acendeu um cigarro, pigarreou, colocou uma velha e empoeirada fita K-7 no Philips. Pensou que já era hora de se render ao CD. Descartou a idéia.

Puxou um cinzeiro de vidro e esperou. Passou um tempo quase prolixo e aí a música começou. E era Charlie Parker. Achou então que foi um tempo que não pesou esperar. Pensou em resignar-se. Pensou em ajoelhar-se e rezar o rosário. Pensou em emudecer pro resto da vida. Pensou em outras mulheres e sugou a fumaça pra dentro do peito. Pensou em se matar. Pensou em roubar um banco. Pensou em ver um filme. Pensou em tirar segunda via de identidade. Pensou em comprar um quadro de Gauguin. Pensou em estudar Brahms. Pensou em não pensar em nada e soltou uma fumaça disforme. Ufanou-se da sua coleção de livros do Borges, todos com capa verde, edição de luxo. Achou sua unha do pé grande demais. Achou-se combativo e hostil ao mesmo tempo. Calculou não haver mais muitos como ele. Concluiu que o Jazz era ainda um dos poucos lampejos de decência da humanidade. Teve pena da história de Rodney King. Marejou os olhos ao lembrar a letra de "O Bêbado e o Equilibrista". Achou graça de pensar em tantos paradoxos. Sentiu-se pedante e sorriu entre o fog do cigarro. Sentiu fome mas nada fez a respeito. Ouviu de além-da-janela o barulho de crianças brincando na rua. Teve vontade de ver mas permaneceu ali sentado com os pés sobre a mesa e o cigarro já quase diluído a ponto de queimar-lhe entre os dedos. Praguejou contra a Souza Cruz. Bateu as cinzas no cilindro de vidro. Sentiu náuseas. Quase vomitou. Conteve-se. Suava Frio. Refletiu sobre sua vida. Lembrou da infância, dos inúmeros álbuns de cromos, das bandeirinhas, jogos de botão, brinquedos Revel, mangás, Capitão Sete, Vila Sésamo, Ultraman, Ultraseven, Shazam & Cia, Joe O Fugitivo, Corrida Maluca. Sentiu seu hálito forte. Entregou-se à brisa que entrava com a noite. Tomou fôlego e sucumbiu à ideia de viver ainda um pouco mais.

Abraços

3 comentários:

Anônimo disse...

Olá!! Nunca vi uma pessoa ter inspiração tão cedo assim, mas enfim... rsrsrs. Concordo plenamente com você. Para podermos amar ao próximo, temos que primeiramente amar a nós mesmos.

Edilson Barros disse...

obrigado pelo comments

Simone Máximo disse...

"Já perdoei erros quase imperdoaveis, tentei substituir pessoas insubstituiveis.Já fiz coisas por impulso,já me decepcionei com pessoas qdo nunca pensei em me decepcionar, mas tb decepcionei alguém.Já abracei pra proteger, já dei risada qdo não podia, fiz amigos eternos,amei e fui amada,mas tb já fui rejeitada, fui amada e não amei.Já gritei e pulei de felicidade, já vivi de amor e fiz juras ouvindo música e vendo fotos, já liguei só pra escutar a voz, me apaixonei por um sorriso, já pensei que fosse morrer de tanta saudade e tive medo de perder alguém especial[acabei perdendo!] Mas vivi! E ainda vivo!Não passo pela vida.Bom mesmo é ir a luta com determinação, abraçar a vida e viver com paixão, perder com classe e vencer com ousadia, porque o mundo pertence a quem se atreve e a VIDA é MUITO para ser insignificante"..................................